Saturday, August 11, 2007

OBESOS

É vê-los!
Passeiam-se obesamente – vulgo inchados - na via pública, de um modo muito geral a pé, quando visitam oficialmente um qualquer lugar, procedem a uma qualquer inauguração ou mesmo quando no espaço temporal têm por “perto”um acto eleitoral.
É vê-los obesamente – mesmo que fisicamente não o sejam – prenhes da importância a que o acto público em si obriga.
Arrastam atrás da comitiva os mais diversos órgãos de comunicação social, convocados previamente por um comunicado, que interessa pouco esclarecedor, de um gabinete oficial de imprensa de governo, na busca de uma qualquer notícia mesmo que sem a mínima importância para o cidadão comum.
Só os fotógrafos estão numa posição frontal, permitindo-lhes assim obter imagens dos sorrisos previamente definidos e forçados ou mesmo dos beijos “lambuzados” de e para as criancinhas e velhinhas.
Depois é o regresso a “casa” com a sensação do dever cumprido e já no descanso de uma qualquer viatura, de preferência preta e de cilindrada digna para a posição oficial a que se propõe, pensando para com os “seus botões” que afinal a “coisa” correu bem e que nem surgiram grandes complicações – entendendo-se por tal, as perguntas mais ou menos inoportunas que o dirigente local e da mesma “cor” partidária não conseguiu controlar.
Que interessa que a obra que se inaugurou no momento só venha a ter o seu fim dali a dois anos – claro que por motivos de dificuldades financeiras, como se usa afirmar – e que já tenha vindo a “derrapar” dos últimos três planos anuais, se tudo correu bem e o povo de memória curta – pela “excitação” de ver pessoalmente os seus governantes, quais “Marcos Paulos” – tenha esquecido todas as promessas feitas no passado, principalmente em campanhas eleitorais?
De um modo geral todos se sentem felizes e até ao bombeiros, que ao fim de uma década lá conseguiram ter uma nova ambulância ficando para as próximas duas décadas o novo quartel, ou os escuteiros que conseguiram finalmente ter uma sede que já possui uma pequeníssima casa de banho unisexo, conseguiram estar presentes de modo emproado e mostrando que existem para “recepcionar” as entidades oficiais.
Até a banda de musica local e cujos instrumentos musicais na sua aquisição teve, a seu tempo, uma ajuda governativa, conseguiu produzir alguma música do esforço do interior das suas fardas a necessitarem de mais um pequeno empenho das entidades oficiais, para a sua substituição.
São as doenças do sistema governativo.
Outras existem e que eu identificaria como as doenças do sistema partidário o qual se “encaixa” num outro sistema mais abrangente e que se identifica de democrático, este em que de momento vivemos.
Este sistema democrático que encontra no sistema partidário não a sua força natural, consistente e de suporte ao seu fortalecimento, mas antes uma corpo “estranho” que a não sofrer um tratamento de choque – por o tratamento paliativo já não é possível – pode muito bem vir a torna-se moribundo porque de morte não é possível falar-se.
A democracia encontra-se fragilizada pela própria maneira de encarar a acção política, a qual sendo resultado de um voto de confiança do povo bastas vezes se “vira” contra ele mesmo, surgindo mais como uma imposição dos que conseguiram, a seu tempo, receber o voto.
Lobos envoltos em peles de cordeiros que quando “surgem” e têm a certeza no resultado do seu acto de atacar, o fazem da maneira mais fria que lhes é possível e tudo a bem de “algo” que por vezes de muito difícil de identificar até nem pensamos – nós o povo – no que nos estão a fazer.
Depois é vestir novamente a pele de cordeiro, de preferência previamente lavada numa qualquer lavandaria local, de modo que de tão alva nos ofusque de promessas novas ou mesmo repetidas em qualquer período eleitoral.
E a estória irá repetir-se e muitos de nós, de um modo mais ou menos masoquista, iremos admitir muitos dos momentos sádicos que a governação irá novamente mostrar.
No entretanto e em minha opinião, outros grupos de obesos são constituídos.
São obesos do tipo camaleão, que mudam de posição partidária de acordo com as necessidades de se servirem a si próprios e com o fito de sobreviverem no nível sócio-financeiro que previamente tinham.
São os obesos que se identificam com a “lei da rolha” – por muito que os tentemos “afogar” eles sobem sempre à superfície e não há machado que “corte” estes obesos camaleónicos.
São os obesos partidários, uns gordos por si mesmo e para os quais não há “dieta” possível, outros inchados pelo momento mais ou menos efémero mas empolgante que vivem.
Quaisquer um deles quase não conseguem “caber” nas cadeiras de chefia pública que lhe foi destinada, mostrando apenas a sua incompetência perante os funcionários que de um modo geral – pertencendo ou não ao mesmo ramo partidário – se riem ou mesmo lhes conseguem adaptar qualquer anedota mais em voga ou no seu sentido “máximo” conseguem mesmo inventar uma nova.
Os obesos “inchados” sentem que a sua situação não é a mais segura pois qualquer alfinetada de um hierárquico superior partidário, perante uma atitude mais ou menos consentânea com o esperado, pode esvaziar o seu conteúdo, qual balão que se fura.
Mostram todos, neste conjunto de obesos, uma tendência para não fazer “ondas” de modo a não desagradar, uma preocupação de que os superiores a nível partidário sejam bem servidos e que tenham atitudes que lhes permitam – nem que seja no período antes das eleições – mostrar publicamente que nós não seremos nada sem eles e que devemos confiar-lhes o nosso voto por tudo o que (não) fizerem ou fizeram (menos) bem, para que o seu posto de “trabalho” esteja garantido.
Para todos os efeitos, mesmo que reconheçam que nós outros temos razão ou que consigam ver, o que seria uma verdadeiro milagre, que o “rei” vai nu, sabem que não o devem admiti-lo pois isto seria o seu passaporte para uma vida menos privilegiada.
E eles não o querem, porque muitas vezes tal seria um retrocesso, quer por voltarem aos seus insignificantes lugares de trabalho quer porque ficariam ao mesmo nível dos antigos funcionários que chefiaram de modo mais ou menos despótico e sem que se lhes possa atribuir nota positiva ao seu desempenho.
No entretanto a democracia encara a situação de quem governa e de quem é oposição de um modo sádico. Aos primeiros, embora se deva admitir que tal não deve existir, dá-lhes a possibilidade de que governa, tirando aos segundos estas hipóteses.
Quem governa pode mostrar trabalho – o que é justo se ele servir o povo e estiver bem realizado – apresentar as mais esfarrapas desculpas para o que não fez ou fez mal, lançar primeiras pedras, inaugurar “atabalhoadamente” edifícios, fontanários, troços de estrada, etc…financiar festas e festanças (com ou sem “condimentos” abrasileirados), promover a sua visualização ou mesmo uma distribuição oficial de beijos lambuzados, etc…etc…
Embora possa admitir que me encontro dentro do grupo obeso, em sentido lato da palavra, tenho a certeza de que, tanto eu como muitas das pessoas que conheço em idênticas circunstâncias não se conseguem incluir no grupo desta obesidade neuronial, que é doença muito em voga nos políticos e afins.
Obesos para quê e porquê, se nem conseguem que a democracia que assumem assuma todos os cidadãos com igual oportunidade, assumindo preferencialmente e quando muito os grupos mais em risco, como são as crianças, os velhos e os excluídos socialmente.
In Correio dos Açores

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