Estou estupefacto comigo mesmo!
Ao fim de quase ano e meio de morar num prédio de apartamentos apenas hoje me apercebi que o meu vizinho de andar possui um capacho junto da sua porta de entrada.
Não que eu queira adquirir um semelhante ou mesmo igual ao do meu vizinho, mas o certo é que a constatação da sua existência me fez pensar qual o papel desempenhado por um capacho.
Um capacho é “algo” que existe para ser “adquirido” de acordo com o sentido das nossas necessidades, sabendo nós que ele está sempre lá – a não ser que venha a ser roubado por outrem, possivelmente no sentido de lhe dar maior ou melhor utilização - sempre disponível para nos servir.
Na minha óptica existem capacho dos mais diversos feitios.
Tanto quanto os consigo identificar, olhando nos diversos “locais” principalmente públicos, eles têm aspecto gordo e magro, são pequenos ou compridos, uns apresentam um aspecto mais “embelezado” do que outros, alguns estão sempre como que a dizer “bem-vindo” ou de um modo mais subjugado com um aspecto de “limpe-se aqui, estou sempre disponível”, etc…
Uns são de fitas de pano entrelaçadas e coloridas, outros são de ráfia, outros de pano ou borracha ou mesmo de um qualquer plástico mais ou menos com alguma garantia de vida útil.
Podem ser novos e de certo de tanto servirem irão ficar gastos ou podem ser velhos e na sua infinita sabedoria, de tanto servirem o “dono” ainda vão sendo utilizados perdendo a confiança do mesmo quando já não conseguem realizar o serviço pretendido e o “dono” começa a tropeçar nos seus “buracos” e se começam a esfarrapar.
O certo é que são capachos “comprados” pelas mais diversas maneiras por um qualquer “dono”.
Não passam de horríveis e meros capachos dependentes que sabem que o seu tempo de utilização é limitado e que de um momento para o outro podem ser substituídos por um outro qualquer capacho mais novo e que na oportunidade de apresenta de maior utilidade.
Um capacho é “algo” que existe junto do “dono” porque este o decidiu “adquirir” de modo a satisfazer as suas mais diversas necessidades, sendo importante que este – o capacho - na generalidade das vezes se aperceba de que tem que agradar ao “dono”.
É ele que recebe no seu “intimo”, quase sem necessidade de o “dono” se manifestar por palavras ou gestos, o sujo ou mesmo o molhado que os pés calçados lhe depositam em cima.
É ele que sabe por intimidade recolhecer a necessidade de não se manifestar contra este contacto, admitindo que ao ser servil será recompensado.
É ele que consegue distinguir se o “dono” andou pelos sítios que deveria ter andado ou se deu alguma “curva” menos própria por terrenos mais areados ou pantanosos ou mesmo se a sola do sapato direito ou esquerdo começa a tornar-se “calva” ou mesmo se já tem buraco a precisar da acção directa de algum sapateiro.
O certo é que ao ser admitido para servir o “dono” o capacho para além de lhe satisfazer algumas das suas pretensões se mantém fiel e não confidencia as intimidades, mesmo que para isso tenha de renegar a todos os seus princípios que é “limpar” todos os que nele põe os pés.
O capacho torna-se mesmo “obsessivo” no que respeita a servir o “dono”, mostrando a irritação perante terceiros quando assume que o “dono” está a servir-se de um outro qualquer capacho.
Pode mesmo torna-se perigoso e fazer a em alguém escorregar na sua beira estrategicamente dobrada, quando assume que um outro capacho consegue estar de um modo regular e por algum tempo com o seu “dono”, pois assume que o seu futuro poderá estar em jogo, podendo ser despromovido e passar a ser utilizado, numa identificada despromoção, na casota do cão do “dono” ou mesmo ser mandado de modo definitivo para o lixo.
O que o capacho mais deseja é fazer o seu serviço, de modo que o “dono” continue de tempo a tempo a utiliza-lo e a sentir que tem o seu futuro assegurado enquanto o dono permanecer no “apartamento” que ocupa por algum tempo.
A potencial mudança de inquilino no “apartamento” é algo que não deixa o capacho descansado.
Ele sabe que para além de lhe ter custado muito a adquirir aquela posição junto do “dono” – para isso teve que mostrar antecipadamente e durante bastante tempo os seus valorosos predicados – substituiu outro qualquer capacho de um outro qualquer inquilino que, tal como o dono, ocupou por maior ou menor espaço de tempo o “apartamento” onde estão.
No decurso do seu tempo de “serviço” as oportunidades foram surgindo e não só foi passível acrescentar mais alguns capachos que desempenhavam o seu serviço nas outras partes do apartamento, tendo sido possível que capachos que lhe eram familiares se tornassem parte integrante dos servidores do seu “dono”.
Enfim o sucesso!
O sucesso pelo qual tanto haviam lutado e sofrido, não só pelo entrelaçar dos seus pedaços coloridos de pano – sim no fim eram capachos apenas feitos de fitas de pano – sendo sempre de temer que o “dono” tivesse a péssima ideia de adquirir capachos de outro qualquer tipo mais valioso.
Isso seria o fim!
Ontem, como em cada ano, foi comemorado o dia da raça.
Significa isto que o País associa todos os portugueses aos feitos empolgantes praticados no passado por alguns deles e que se tornaram a personificação do orgulho nacional.
Dos feitos bélicos até à arte, passando por tudo o que é “enorme”, Mulheres e Homens deram todo o seu sentir, trabalho e vontade de modo a engrandecer Portugal, bastas vezes sem assumirem que tal lhes seria reconhecido.
Assumo que nunca, mas mesmo nunca, estes nossos mais ou menos recentes heróis consideram a hipótese de que no conjunto da raça nacional fosse possível haver uma “raça de capachos” que voa ainda mais baixo do que o crocodilo da anedota do menino da escola.
In Correio dos Açores
Saturday, August 11, 2007
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
No comments:
Post a Comment